quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Memórias: Capela da Misericórdia da Sertã


As nossas memórias de hoje evocam o passado da capela da Misericórdia da Sertã, um dos templos religiosos mais antigos do concelho e que recentemente sofreu profundas obras de restauro e conservação. A sua data de construção é desconhecida mas sabe-se que já existia antes de 1543, pois neste ano o Grão-Prior do Crato autorizou que ali se erigisse um novo altar.
A capela esteve inicialmente sob os auspícios da Confraria de São João da Sertã, passando depois (1547) para o controlo da Santa Casa da Misericórdia.
Manso de Lima referia-se assim a este templo em 1730: “A capella mór é mui aceada com sua tribuna dourada, o tecto apainelado de brutesco dourado e toda ella de azulejo de figuras com a vida de Nossa Senhora”.
Este templo, de uma só nave, possui dois altares laterais (Senhor dos Passos e Senhor dos Aflitos), duas sacristias, coro-alto em madeira, suportado por duas colunas em ardósia, e arco triunfal de volta perfeita. No tecto surge pintado o brasão da Misericórdia, além de outros motivos decorativos.
Aqui está sepultado o insigne Vicente Caldeira (alcaide-mor da vila da Sertã e provedor da Misericórdia durante vários anos no século XVI) e sua mulher Isabel de Alcobia.
Foto: Olímpio Craveiro

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Incêndios florestais: um problema sem solução?


Os incêndios destruíram, entre 1980 e 2010, uma área florestal de 39 mil hectares no concelho da Sertã. O rasto de destruição é impressionante, todavia parece tardar uma estratégia corajosa que ajude a combater este flagelo ou, pelo menos, a mitigá-lo.
Todos os anos, a Sertã e muitos concelhos portugueses assistem impotentemente à devastação de um dos seus principais recursos. Os bombeiros fazem o que podem, mas nada parece deter a violência das chamas. E essa violência é, por vezes, proporcional aos problemas que atingem actualmente a nossa floresta.
Esses problemas são muitos e estão, no caso da nossa região, devidamente identificados. Diversos relatórios publicados, ao longo dos últimos anos, elencaram alguns deles: existência de áreas demasiado extensas de povoamentos florestais inadequados o que aumenta o perigo de propagação do fogo; baixa capacidade dos produtores florestais para se fazerem representar como grupo de interesse na sociedade; ausência de gestão ou gestão incipiente dos espaços florestais numa proporção considerável. Sobre este último ponto, convém recordar aquilo que Eugénio Sequeira, da Liga para a Protecção da Natureza, escreveu em Dezembro último no jornal Público: “A má gestão ou ausência de gestão ocorre em bem mais de 600.000 hectares  em que a produtividade anual será pouco maior do que cinco metros cúbicos por hectare. Ora, os terrenos geridos pelas indústrias e pelos bons produtores atingem valores duas a quatro vezes essa produtividade, e o risco de incêndios é muito inferior. As áreas sem gestão ou com gestão deficiente constituem na maioria dos casos verdadeiros ‘barris de pólvora’, responsáveis pela grande dimensão dos fogos, pela degradação dos solos e das águas”.
Alguns destes problemas têm décadas. Basta recordar que, já em Agosto de 1962, o então presidente da Câmara Municipal da Sertã, José Antunes, dizia: “A floresta, em virtude de uma organização primitiva e precária, não garante uma melhoria sensível e estável do nível económico”.
A questão fulcral parece ser o que tem falhado ao longo de todos estes anos? A resposta não é fácil e encontrar culpados seria tarefa fastidiosa, tal o rol de candidatos. Contudo, não deixa de ser extraordinário que a intensidade dos fogos florestais, neste e noutros concelhos do país, tenha aumentado a partir da década de 1960, altura em que se iniciou um rápido esvaziamento populacional do Interior português, por via da emigração. A isto é preciso somar o abandono da agricultura e da estrutura fundiária – “mais de 80% das propriedades têm menos de dois hectares, o que com os actuais custos torna incomportável a manutenção de uma produção florestal sustentável, qualquer que fosse a espécie”, notou Eugénio Sequeira, no texto acima citado.
Para agravar a situação, adicione-se o contínuo desinvestimento na educação, formação e fixação das populações, sobretudo no Interior do país, a falta de técnicos qualificados e com conhecimentos sobre técnicas e práticas silvícolas nestas regiões e a ausência de interlocutores para os espaços florestais.
O que pode então ser feito? Recorremos uma vez mais ao artigo de opinião de Eugénio Sequeira: “Uma solução séria implicava a constituição de unidades de gestão nunca inferiores a 400 a 500 hectares, que permitissem a existência de ordenamento e boa gestão, quer seja através de Zonas de Intervenção Florestal que funcionassem, quer através de empresas do tipo Sociedade Anónima ou do Estado. Podíamos aumentar a produção de pasta para papel, aumentar a produção de madeira de qualidade fundamental para a indústria de mobiliário, aumentar a área de montado, que é a defesa contra o avanço do deserto, reduzir a área de eucalipto e melhorar a sua gestão, aumentando emprego, crescimento económico, biodiversidade e qualidade devida”. Outras ideias podem ser encontradas no Plano Regional de Ordenamento Florestal – Pinhal Interior Sul. Citemos algumas: promoção da arborização com espécies cujo potencial seja adequado aos locais; valorização das linhas de água e melhoria dos habitats de suporte às espécies cinegéticas mais importantes; melhoria da gestão dos espaços florestais; aumento da capacidade de detecção de fogos e de primeira intervenção.