O escritor Fernando Bartolomeu relatava, em 1874, que o
centro histórico da Sertã possuía “casas toscamente construídas, muitas
desmoronadas, e outras prestes a isso”. Quase 140 anos depois, o cenário não é
muito diferente e tudo indica que, nas próximas décadas, o coração da vila
sertaginense possa mesmo deixar de bater tal o estado de degradação e abandono
em que se encontra.
O tema não é novo e, nos últimos anos, vários foram os
momentos em que o assunto foi trazido a público, mais para encontrar
responsáveis pela situação do que propriamente sinalizar soluções para o
problema.
Começando pelos responsáveis: a lista é longa e, em abstracto,
todos podemos incluir-nos nela, quanto mais não seja pelo nosso silêncio
complacente. Depois temos os vários executivos autárquicos, actuais e passados,
que falharam redondamente na definição e aplicação de políticas que pudessem
inverter a agonia e abandono que se apoderaram do centro histórico. Os muitos
proprietários da zona têm também a sua quota-parte de responsabilidade. Quantos
deles deixaram que a sua propriedade imobiliária caísse aos poucos, na vã esperança
de assim a valorizarem? Outros pediam rendas excessivas por imóveis que não
justificavam esse tipo de valores. Outros ainda demitiram-se das suas funções
de proprietário, ou porque a recuperação das casas (que lhes chegaram, na maior
parte dos casos, por via de herança) é muito onerosa e sem grande viabilidade
económica (é difícil convencer alguém a morar num local sem grande
estacionamento ou que tem como vizinhos prédios em risco de derrocada) ou
porque os seus interesses há muito estão longe da Sertã, olhando para estas
residências como ‘aquelas casas velhas dos meus pais’.
Chegados aqui, convém perguntar o que podemos fazer para
inverter este cenário? A resposta não é fácil, sobretudo se atendermos a que a
Sertã ganhou novas dinâmicas noutras zonas da vila por contraponto com aquilo
que se passou aqui. E o problema não é um exclusivo da Sertã. Uma visita às
cidades de Lisboa e Porto devolve-nos o mesmo cenário que podemos observar por
aqui.
Uma das soluções para esta zona poderá passar por olhar todo
este território de uma forma integrada e não isolada, tal como sucedeu na
cidade de Coimbra, que tem o seu centro histórico nas mesmas condições. A
requalificação de toda esta zona é fundamental, mas para isso é necessário envolver
proprietários, comerciantes, autarquia, associações e escolas, sentando-os à
mesma mesa para discutir o problema e tentar encontrar soluções de compromisso.
Não é trabalho fácil, aliás arrisco-me a dizer que, no actual contexto socioeconómico
do concelho, não restará grande esperança ao centro histórico. Todavia não
podemos deixar de acreditar que algo pode ser feito.
Depois de se ter deixado cair a Casa da Guimarães, e com ela um pedaço
de história sertaginense, e de outros imóveis caminharem para o mesmo destino,
seria importante estancar este problema. E penso que a saída da Junta de
Freguesia da Sertã do centro histórico não ajudará muito ao actual estado de
coisas.