Os
incêndios destruíram, entre 1980 e 2010, uma área florestal de 39 mil hectares
no concelho da Sertã. O rasto de destruição é impressionante, todavia parece
tardar uma estratégia corajosa que ajude a combater este flagelo ou, pelo
menos, a mitigá-lo.
Todos
os anos, a Sertã e muitos concelhos portugueses assistem impotentemente à
devastação de um dos seus principais recursos. Os bombeiros fazem o que podem,
mas nada parece deter a violência das chamas. E essa violência é, por vezes,
proporcional aos problemas que atingem actualmente a nossa floresta.
Esses problemas são muitos e
estão, no caso da nossa região, devidamente identificados. Diversos relatórios
publicados, ao longo dos últimos anos, elencaram alguns deles: existência de
áreas demasiado extensas de povoamentos florestais inadequados o que aumenta o
perigo de propagação do fogo; baixa capacidade dos produtores florestais para
se fazerem representar como grupo de interesse na sociedade; ausência de gestão
ou gestão incipiente dos espaços florestais numa proporção considerável. Sobre
este último ponto, convém recordar aquilo que Eugénio Sequeira, da Liga
para a Protecção da Natureza, escreveu em Dezembro último no jornal Público: “A má gestão ou ausência de gestão
ocorre em bem mais de 600.000 hectares
em que a produtividade anual será pouco maior do que cinco metros
cúbicos por hectare. Ora, os terrenos geridos pelas indústrias e pelos bons
produtores atingem valores duas a quatro vezes essa produtividade, e o risco de
incêndios é muito inferior. As áreas sem gestão ou com gestão deficiente
constituem na maioria dos casos verdadeiros ‘barris de pólvora’, responsáveis
pela grande dimensão dos fogos, pela degradação dos solos e das águas”.
Alguns destes problemas têm
décadas. Basta recordar que, já em Agosto de 1962, o então presidente da Câmara
Municipal da Sertã, José Antunes, dizia: “A floresta, em virtude de uma
organização primitiva e precária, não garante uma melhoria sensível e estável
do nível económico”.
A questão fulcral parece ser o
que tem falhado ao longo de todos estes anos? A resposta não é fácil e
encontrar culpados seria tarefa fastidiosa, tal o rol de candidatos. Contudo,
não deixa de ser extraordinário que a intensidade dos fogos florestais, neste e
noutros concelhos do país, tenha aumentado a partir da década de 1960, altura
em que se iniciou um rápido esvaziamento populacional do Interior português,
por via da emigração. A isto é preciso somar o abandono da agricultura e da estrutura fundiária –
“mais de 80% das propriedades têm menos de dois hectares, o que com os actuais
custos torna incomportável a manutenção de uma produção florestal sustentável,
qualquer que fosse a espécie”, notou Eugénio Sequeira, no texto acima citado.
Para agravar a situação, adicione-se o contínuo
desinvestimento na educação, formação e fixação das populações, sobretudo no
Interior do país, a falta de técnicos qualificados e com conhecimentos sobre
técnicas e práticas silvícolas nestas regiões e a ausência de interlocutores
para os espaços florestais.
O
que pode então ser feito? Recorremos uma vez mais ao artigo de opinião de
Eugénio Sequeira: “Uma solução
séria implicava a constituição de unidades de gestão nunca inferiores a 400 a
500 hectares, que permitissem a existência de ordenamento e boa gestão, quer
seja através de Zonas de Intervenção Florestal que funcionassem, quer através
de empresas do tipo Sociedade Anónima ou do Estado. Podíamos aumentar a
produção de pasta para papel, aumentar a produção de madeira de qualidade
fundamental para a indústria de mobiliário, aumentar a área de montado, que é a
defesa contra o avanço do deserto, reduzir a área de eucalipto e melhorar a sua
gestão, aumentando emprego, crescimento económico, biodiversidade e qualidade
devida”. Outras ideias podem ser encontradas no Plano Regional de Ordenamento Florestal
– Pinhal Interior Sul. Citemos algumas: promoção da arborização com espécies
cujo potencial seja adequado aos locais; valorização das linhas de água e
melhoria dos habitats de suporte às espécies cinegéticas mais importantes;
melhoria da gestão dos espaços florestais; aumento da capacidade de detecção de
fogos e de primeira intervenção.