O assunto do momento são as declarações absolutamente insultuosas que Cavaco Silva fez a propósito da sua pensão, mas o que nos traz aqui é um tema bem diferente (a reforma da administração local), que promete aquecer os próximos tempos, sobretudo depois de se ter ficado a saber que o Governo está a ponderar colocar o ónus da decisão sobre a extinção/fusão de freguesias nas mãos dos municípios. Ou seja, o Executivo parece não querer ficar ligado a um processo tão melindroso e que causa sempre tantas enxaquecas ao PSD, um partido com forte implantação ao nível das autarquias.
O processo já não arrancou bem, isto porque aquilo que era para ser uma reforma que abrangeria concelhos e freguesias rapidamente se circunscreveu a estas últimas. Pedro Passos Coelho tratou de dizer que a extinção/fusão de municípios era matéria que ficava para o futuro, contradizendo-se a si e ao seu programa, onde afirmava peremptoriamente: “Queremos promover um acordo político alargado para a optimização do número de municípios e freguesias.
São percepcionáveis os receios do primeiro-ministro, mais ainda depois da forma como Miguel Relvas foi recebido num congresso da ANAFRE, onde teve de ouvir as vaias e críticas dos autarcas.
Mas a reforma (necessária há anos, diga-se, e que o Governo de José Sócrates nunca teve coragem para fazer) lá avançou com a apresentação do Documento Verde, onde se fixavam os critérios que haveriam de presidir à extinção/fusão de freguesia. Os critérios centravam-se, quase exclusivamente, no número de habitantes que cada freguesia deveria possuir para não ‘desaparecer’, sendo considerado como atenuante o facto de as freguesias, poderem estar em área rural ou urbana ou a uma distância considerável da sede de município.
No caso do concelho da Sertã, e como aqui dissemos há uns meses, as freguesias a extinguir/agregar seriam seis (Carvalhal, Ermida, Figueiredo, Marmeleiro, Palhais e Nesperal), o que obrigaria a uma reorganização do território sertaginense e ao redesenhar do nosso mapa municipal.
Perante esta matéria, a Assembleia Municipal da Sertã decidiu (e bem!) fazer eleger uma comissão que terá como funções discutir o Documento Verde e apresentar um conjunto de soluções alternativas ao cenário proposto.
Todavia, no último dia 12 de Janeiro, ficámos a saber, através do secretário de Estado da Administração Local, Paulo Júlio, em entrevista ao Jornal de Notícias, que a estratégia do Governo mudara: “Em coerência com o que sempre dissemos, vamos deixar que sejam os municípios a decidir dentro do seu território” que freguesias serão extintas ou agregadas. http://www.mynetpress.com/mailsystem/noticia.asp?ref4=4%23k&ID=%7B9F3B9864-4175-4FF0-BC60-049CD063529B%7D
A ideia do Executivo é agora “envolver todos os autarcas e serem eles os propositores da nova reorganização administrativa”, referiu Paulo Júlio. Mas o governante também deixou um aviso: os critérios orientadores e as metas de agregação e extinção de freguesias previstos no Documento Verde permanecem válidos na proposta de lei, sendo que os municípios e as freguesias que não reorganizarem o seu território pagarão o ónus da sua atitude. O mesmo é dizer, o Governo reserva-se no direito de, caso não sejam atingidas as metas propostas na reforma enunciada, poder tomar uma decisão administrativa de extinção/fusão de freguesias.
Aguardamos, agora, com expectativa a publicação do projecto de lei, prometido para este mês, e onde se ficarão a conhecer os critérios definitivos sobre esta reforma. Será interessante perceber se as palavras do secretário de Estado correspondem ou não à verdade.
Se assim for, estaremos expectantes com o debate que se irá iniciar na autarquia sertaginense tendo em vista a resolução deste dossiê. Se a extinção de algumas freguesias parece pacífica (casos de Figueiredo, Ermida ou Marmeleiro), o mesmo já não se aplica no caso do Carvalhal, como o antigo e actual presidente da junta a manifestarem publicamente o seu desagrado pela extinção da freguesia.
Fazemos votos, contudo, para que o debate a realizar seja sério e não marcado pelas habituais ‘tricas’ partidárias que tanto prejudicam a democracia sertaginense.
É que esta poderá ser uma oportunidade única para se repensar o território sertaginense, de forma aberta e transversal. A população deve ser ouvida. Para terminar apenas uma nota: curiosamente, ou não, se olharmos para o actual quadro de freguesias a extinguir no concelho da Sertã, temos que todos os partidos vão perder juntas, com claro prejuízo para o CDS-PP que lhe vê serem subtraídas as duas únicas que possuía (Ermida e Marmeleiro). O PSD perde três freguesias (Figueiredo, Nesperal e Palhais) e o PS uma (Carvalhal).