terça-feira, 29 de novembro de 2011

Jornais antigos: O Zephyro

Começou a publicar-se no dia 30 de Junho de 1898 e dava pelo nome de «O Zephyro». O jornal, com sede em Cernache do Bonjardim, tinha uma periodicidade semanal e propunha-se abordar temáticas como a religião, a literatura e as artes.
A ideia para a sua fundação partiu de Fabião de Almeida e inicialmente a circulação do jornal restringia-se ao interior do Seminário das Missões Ultramarinas, funcionando mesmo, em alguns momentos, como uma espécie de porta-voz da instituição.
A publicação, de cariz assumidamente amador, tinha um número bastante reduzido de cópias na rua, devido ao facto de ser manuscrita. O redactor António Pedro Ramalhosa assegurava a escrita das notícias e Pedro Lourenço desempenhava as funções de secretário na redacção.
Não sabemos até quando se publicou este jornal, mas é um facto que o mesmo ainda existia nos primeiros anos do século XX.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Sertã tem poder de compra abaixo da média nacional

O poder de compra per capita no concelho da Sertã está 36 por cento abaixo da média nacional. Esta é uma das conclusões que é possível tirar da análise do estudo sobre o poder de compra que o Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgou recentemente e que assenta em dados relativos ao ano de 2009.
A tendência identificada na Sertã é extensível, contudo, a todos os concelhos que integram a região do Pinhal Interior Sul: Oleiros (- 46%), Proença-a-Nova (- 43%), Vila de Rei (- 40%) e Mação (- 34%). Aliás, o Pinhal Interior Sul (onde a Sertã se inclui) é aquele que apresenta a percentagem de poder de compra mais baixa de Portugal Continental, com 0,229 por cento.
Estes são números muito preocupantes para a nossa região e sobretudo para o país que, usando um termo muito em voga neste momento, vive a duas velocidades, com um fosso cada vez maior entre Litoral e Interior. Mais do que um problema de crises, esta é uma questão estrutural.
Basta ver que no conjunto dos 308 municípios portugueses apenas 39 apresentam um poder de compra per capita acima da média nacional. E onde estão estes municípios? Nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e em algumas capitais de distrito.
Além disso, é ilustrativo este número divulgado pelo INE: “o indicador de Poder de Compra revela que 27 municípios concentram 50 por cento do poder de compra nacional”.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Memórias: Mercado Bittencourt



O dia 2 de Julho de 1916 ficou marcado pela inauguração da “obra mais grandiosa desta geração (…), suficientemente grande para fazer o orgulho de certas vilas e até de algumas cidades”. Esta passagem do discurso, que o Padre Cândido Teixeira proferiu durante a abertura do Mercado Bittencourt, em Cernache do Bonjardim, atesta bem do orgulho e alegria que esta obra provocou entre os habitantes da freguesia naquele domingo de início de século.
O mercado era já uma velha aspiração da então aldeia de Cernache, mas a falta de dinheiro atrasou a concretização deste sonho. Foi então que entrou em cena o coronel António Clemente Ribeiro Bittencourt, governador do Estado do Amazonas, que durante uma visita realizada a Cernache, em 1909, na sequência de um convite de Joaquim de Paula Antunes, ficou sensibilizado com a pretensão dos cernachenses, relativamente ao novo mercado, e prometeu que daria o dinheiro necessário para a sua construção.
Joaquim de Paula Antunes ficou encarregue de todo o processo burocrático e o incontornável Abílio Marçal responsabilizou-se pela condução das obras e pela elaboração do regulamento do mercado.
O resto é história para contar um dia.

Povoações: Trizio (freguesia de Palhais)

As águas que lhe banham as margens são muito procuradas pelos sertaginenses, e não só, durante os meses de Verão mas poucos são os que conhecem a história deste lugar e o que as areias do tempo por aqui deixaram escondido. A povoação que hoje destacamos é o Trizio, lugar pertencente à freguesia de Palhais.
Não é difícil aceitar a ideia de que o povoamento do Trizio terá muitos séculos, dada a sua grande proximidade ao rio Zêzere (com muito pescado) e por beneficiar de solos bastante férteis nos seus limites. Num documento de 1758, o Padre Crisóstomo Luís Aires escrevia que “o rio Zêzere traz bastante peixe. Suas pescarias se fazem as melhores no tempo mais frigido, quando há as maiores geadas, e então se apanham bastantes peixes machos e bogas e alguns machos de quinze e vinte arráteis”.
Segundo os censos mandados fazer em 1527, o Trizio contava nesta altura com 14 fogos, número que aumentou para 26 (em 1730) e 30 (1891). É curioso verificar que, durante boa parte do século XX, este foi o lugar mais povoado da freguesia de Palhais, sendo que ainda hoje a sua população deverá rondar a centena de pessoas.
Em resultado desse elevado número de habitantes, não é de estranhar que o Trizio já dispusesse, em 1937, de um posto escolar, a funcionar numa das casas da aldeia. Aliás, este posto seria encerrado temporariamente no final de 1938, por falta de condições da referida casa, reabrindo dois anos depois num novo local (uma casa de habitação cedida por uma das famílias mais abastadas do lugar).
A Capela de São Pedro, existente na aldeia, é uma das mais antigas da povoação, sendo certo que a mesma já existia no início do século XVIII. As obras aí realizadas há algumas décadas descaracterizaram bastante o templo original, restando pouco desses primitivos tempos. Esta ermida tinha um capelão, que antes de 1772 era pago pela população e que após essa data passou a ser remunerado pelo Priorado do Crato (o seu salário era “hum moyo e 30 alqueires de trigo”). Manuel Caetano de Andrade, natural do Trizio, ocupou o lugar de capelão durante mais de 40 anos, entre a última década de 1790 e os anos de 1830.
De acordo com a população, o Trizio foi, desde sempre, procurado por muitos clérigos que aqui rumavam, buscando recolhimento para o seu trabalho espiritual. Ainda hoje, se mantém de pé a casa que recebeu muitos destes ‘viajantes’ (e que foi morada do próprio capelão da aldeia), situada junto à capela. Por cima da porta de entrada, pode observar-se a data de construção: 1742. Há quem diga que existia, inclusive, um túnel que ligava esta casa à capela, apesar de não ter sido possível verificar a autenticidade desta informação.
Em tempos recuados, e segundo documentos da antiga Ordem de Malta, o Trizio dispunha de uma barca que fazia o transporte de pessoas entre este lugar e o de Águas Belas, no concelho de Ferreira do Zêzere. A Barca do Trizio começou as suas viagens há mais de 500 anos.
Hoje, o Trizio preserva muitas destas histórias através dos seus moradores mais antigos. Talvez ainda possamos ir a tempo de recuperar algumas.
De destacar ainda nesta povoação o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido pelo Centro Náutico do Zêzere, na dinamização de diversas actividades nas águas do Zêzere, e do Centro Social, Cultural, Recreativo e Desportivo do Trizio, que assistiu à inauguração da sua nova sede em Novembro de 2007.

Fontes: A Sertã e o seu Concelho; Antiguidades, Famílias e Varões de Sernache do Bom Jardim Vol.2, Folha de Pagamentos do Almoxarifado da Sertã; Casa do Infantado; Documentos da Ordem de Malta e do Priorado do Crato; Descrição Geral do Reino de Portugal; entrevistas presenciais com alguns habitantes do Trizio

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Padre Manuel Antunes: a homenagem e um pouco da sua vida

A Casa da Comarca da Sertã vai homenagear o Pe. Manuel Antunes, S.J. (as siglas dizem respeito a Societas Iesu – Companhia de Jesus) num jantar que terá lugar no próximo dia 4 de Novembro, em Lisboa. Na ocasião será apresentada a obra completa deste ilustre sertaginense, editada em 14 volumes pela Fundação Calouste Gulbenkian e cuja coordenação geral esteve a cargo de José Eduardo Franco, presidente da Direcção do Instituto Europeu de Ciências da Cultura Padre Manuel Antunes. Marcarão ainda presença neste evento o conhecido comentador Marcelo Rebelo de Sousa, Manuel José do Carmo Ferreira, presidente da Sociedade Científica da Universidade Católica Portuguesa, e Raul Miguel Rosado Fernandes.
Aproveitando a oportunidade e por se celebrar no dia 3 de Novembro o 93.º aniversário do seu nascimento, deixamos aqui algumas notas biográficas e tentamos reconstruir um pouco daquilo que foi o percurso de um homem a quem um dia o Diário de Notícias chamou de “intelectual ecuménico”.
Manuel Antunes nasceu na vila da Sertã a 3 de Novembro de 1918, sendo filho de José Agostinho Antunes e de Maria de Jesus. Era o mais velho de três irmãos (os outros eram José Antunes – que foi presidente da Câmara da Sertã – e Maria do Céu Antunes) e aos 13 anos ingressou no Seminário Menor da Companhia de Jesus, em Guimarães, a que se seguiu a sua entrada, a 7 de Setembro de 1936, no noviciado da Companhia de Jesus, em Alpendorada (Marco de Canaveses).
Foi aí que fez a sua primeira profissão religiosa (8 de Setembro de 1938), tendo depois completado os estudos humanísticos e frequentado o Instituto Superior Beato Miguel de Carvalho (hoje Faculdade de Filosofia de Braga). Licenciou-se em Filosofia, apresentando a dissertação «Panorama da Filosofia Existencial de Kierkegaard a Heidegger».
Depois de um breve período a leccionar Língua e Cultura Latina e Grega, matriculou-se na Faculdade de Teologia de Granada (Espanha), onde se formou em Teologia, completando a sua formação religiosa em Namur (Bélgica).
No dia 15 de Julho de 1949, recebeu a ordenação sacerdotal, conferida pelo bispo de Guadix, D. Rafael Alvarez de Lara, e celebrou a sua missa nova a 31 do mesmo mês na igreja de Nossa Senhora de Fátima, no Porto.
Voltou ao ensino para leccionar no Curso Superior de Letras da Companhia de Jesus e, em Setembro de 1955, rumou a Lisboa para integrar a redacção da revista Brotéria, que havia mais tarde de dirigir (entre 1965 e 1982). A cultura e a filosofia eram os seus temas predilectos nesta influente publicação, que divulgou também vários textos de crítica literária deste autor.
No mês de Outubro de 1957, o escritor Vitorino Nemésio, na altura director da Faculdade de Letras de Lisboa, convidou-o para leccionar, naquela instituição, as cadeiras de História da Cultura Clássica e de História da Civilização Romana. Mais tarde regeu igualmente a cadeira de História da Filosofia Antiga e de Ontologia.
“Creio que jamais faltei a uma das suas aulas e lembro-me que o anfiteatro I da Faculdade estava sempre cheio quando falava”, recordou José Medeiros Ferreira, antigo ministro dos Negócios Estrangeiros do primeiro Governo de Mário Soares, em depoimento recolhido pelo Diário de Notícias.
O seu amigo João Maia escreveu: “Era um sábio, dono de prodigiosa informação. Sabemos que o seu poder de estudo era de tal ordem que conseguia integrar, numa bela síntese vital, paralelos sectores de ciências e de saberes”.
Por seu lado, António Leite, num pequeno opúsculo publicado aquando da morte do Pe. Manuel Antunes, dizia: “O que todos os seus alunos mais admiravam era a sua vastíssima e multiforme cultura, o seu poder de síntese, a clareza e vigor da exposição, o seu aspecto modesto e acolhedor, que tornava as suas aulas e a sua convivência muito apreciadas”.
A sua produção literária era invejável. Além de dirigir a revista Brotéria, colaborou com outras publicações, designadamente a Euphrosyme e a Revista da Faculdade de Letras de Lisboa, tendo assinado também alguns dos artigos que integraram a Enciclopédia Luso-Brasileira, da editora Verbo. Na obra publicada, encontramos uma vasta lista de títulos, de onde se destacam: «Do Espírito e do Tempo» (1960), «Grandes Derivas da História Contemporânea» (1972), «Educação e Sociedade» (1973) e «Repensar Portugal» (1979).
Em 1981, recebeu o título de Doutor ‘Honoris Causa’ da Faculdade de Letras de Lisboa e dois anos depois, no dia 10 de Junho, o presidente da República Ramalho Eanes conferiu-lhe o grau de Grande Oficial da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada.
A ligação entre o Padre Manuel Antunes e Ramalho Eanes era bastante estreita, a ponto de o general o ter convidado para seu conselheiro. O antigo presidente da República disse numa entrevista, publicada há alguns anos, que o Pe. Manuel Antunes “era um homem com um profundo conhecimento, de grande prudência, com convicções muito sólidas e com grande carácter”. Acrescentando depois que “o ouvia sobretudo para as grandes questões políticas, ou seja, as questões que tinham que ver com o Estado, com o seu funcionamento, e as relações com a sociedade civil”.
A partir de 1983, o seu estado de saúde agravou-se, vindo a falecer no dia 18 de Janeiro de 1985, no Hospital de Santa Maria, em Lisboa. No seu funeral, marcaram presença algumas das principais individualidades políticas da época, como Mário Soares, Carlos Mota Pinto e Francisco de Sousa Tavares. A Assembleia da República, em sinal de homenagem, guardou um minuto de silêncio em sua memória.
Muito mais haveria a dizer sobre o Pe. Manuel Antunes, mas por agora fica o essencial – o resto da descoberta ficará a cargo de cada um. Como disse a escritora Sophia de Mello Breyner Andresen: “Havia uma coisa extraordinária no padre Antunes: uma grande ligação entre a cultura e a vida”.
João Bénard da Costa, o saudoso e ‘eterno’ director da Cinemateca Portuguesa, sabia-o muito bem e por isso terá afirmado: “Ao Padre Manuel Antunes poderá aplicar-se o que ele próprio disse um dia de Kierkegaard: «um ser que nunca foi criança, nunca foi adolescente, nunca foi jovem, mas adulto, sempre adulto»”.
Na Sertã, além de um monumento erigido em sua memória (cada vez mais escondido), existe também uma rua com o seu nome, mais precisamente a que está em frente ao terminal rodoviário.

Fontes: «Padre Manuel Antunes, S.J. 1918-1985» (Luís Machado de Abreu e José Eduardo Franco); «Padre Manuel Antunes» (João Maia); «Padre Manuel Antunes (1918-1985) – Interfaces da cultura portuguesa e europeia» (coord. José Eduardo Franco e Hermínio Rico); Diário de Notícias